Por
esse pão pra comer, por esse chão pra dormir
A certidão pra nascer e a concessão pra sorrir
Por me deixar respirar, por me deixar existir
Deus lhe pague
Pela
cachaça de graça que a gente tem que engolir
Pela fumaça e a desgraça, que a gente tem que tossir
Pelos andaimes pingentes que a gente tem que cair
Deus lhe pague!!!
Chico Buarque - construção
Amou daquela vez como se fosse a última
Beijou sua mulher como se fosse a última
E cada filho seu como se fosse o único
E atravessou a rua com seu passo tímido
O
imigrande nordestino tímido que nunca largaria sua esposa, ela seria a última mulher em sua
vida, arrumou um trabalho, deixou a mulher em casa com os filhos, filhos que
educava como se fossem únicos.
Subiu
a construção como se fosse máquina
Ergueu no patamar quatro paredes sólidas
Tijolo com tijolo num desenho mágico
Seus olhos embotados de cimento e lágrima
Ergueu no patamar quatro paredes sólidas
Tijolo com tijolo num desenho mágico
Seus olhos embotados de cimento e lágrima
Se
sentiu uma engrenagem da industria capitalista, aprendeu a trabalhar, fez
paredes sólidas, se sentiu um mágico e se emocionou por ter uma função no mundo.
Sentou
pra descansar como se fosse sábado
Comeu feijão com arroz como se fosse um príncipe
Bebeu e soluçou como se fosse um náufrago
Dançou e gargalhou como se ouvisse música
E tropeçou no céu como se fosse um bêbado
E flutuou no ar como se fosse um pássaro
E se acabou no chão feito um pacote flácido
Agonizou no meio do passeio público
Morreu na contramão atrapalhando o tráfego
Comeu feijão com arroz como se fosse um príncipe
Bebeu e soluçou como se fosse um náufrago
Dançou e gargalhou como se ouvisse música
E tropeçou no céu como se fosse um bêbado
E flutuou no ar como se fosse um pássaro
E se acabou no chão feito um pacote flácido
Agonizou no meio do passeio público
Morreu na contramão atrapalhando o tráfego
Estava
exausto, comeu por merecimento, se afogou na bebida, se sentiu livre, caiu de
bêbado num cenário de trânsito metropolitano.
Amou
daquela vez como se fosse o último
Beijou sua mulher como se fosse a única
E cada filho seu como se fosse o pródigo
E atravessou a rua com seu passo bêbado
Amou
sua mulher como se fosse o último a amá-la, porém, já não o seria , ela já
não era a única e ele já se tornara alcoólatra, antes atravessava a rua com
seus passos tímidos, agora, bêbado. Seus filhos já eram tratados como despesas.
Subiu
a construção como se fosse sólido
Ergueu no patamar quatro paredes mágicas
Tijolo com tijolo num desenho lógico
Seus olhos embotados de cimento e tráfego
Ergueu no patamar quatro paredes mágicas
Tijolo com tijolo num desenho lógico
Seus olhos embotados de cimento e tráfego
Trabalhou
bêbado, como se estivesse sóbrio, ergueu paredes quase que por mágica, não sólidas como as de antes. Seus
olhos já refletem a cidade grande, barulhenta e impessoal que dominou sua cabeça.
Sentou pra descansar como se fosse um príncipe
Comeu feijão com arroz como se fosse o máximo
Bebeu e soluçou como se fosse máquina
Dançou e gargalhou como se fosse o próximo
E tropeçou no céu como se ouvisse música
E flutuou no ar como se fosse sábado
E se acabou no chão feito um pacote tímido
Agonizou no meio do passeio náufrago
Morreu na contramão atrapalhando o público
Sentou
pra descansar se sentindo merecedor sem ser, comeu o feijão com arroz se fosse
o máximo, bebeu como de costume, como uma máquina que repete sempre a mesma
função, se sentiu livre como se tivesse terminado a semana, antes de terminar,
se sentiu o próximo a tirar sorte grande, como se a vida estivesse no rumo
certo. Se afogou em seu excesso.
Amou
daquela vez como se fosse máquina
Beijou sua mulher como se fosse lógico
Amou
como uma máquina, máquina não ama, máquina repete a lógica programada.
Ergueu no patamar quatro paredes flácidas
Sentou pra descansar como se fosse um pássaro
E flutuou no ar como se fosse um príncipe
E se acabou no chão feito um pacote bêbado
Morreu na contra-mão atrapalhando o sábado
Sentou pra descansar como se fosse um pássaro
E flutuou no ar como se fosse um príncipe
E se acabou no chão feito um pacote bêbado
Morreu na contra-mão atrapalhando o sábado
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